Blue protects white from innocence
Blue drags black with it
Blue is darkness made visible
Derek Jarman, Blue (1992)
Diving into this underwater atmosphere, the body is asked to perform a specific and at the same time ambiguous choreography, halfway between swimming and flying. In Seabed Monsters and the Cosmic Rays, Luís Lázaro Matos's third solo exhibition at Madragoa, one must suspect gravity and be guided by fluctuations. A multimedia installation that emerges as a hybrid ecosystem of lights and foam, sand and planets, ships and sea creatures, confusing the depths of the oceans with the emptiness of the cosmos. In this imaginative exercise, Luís Lázaro Matos invents a world in which empathy between stars and aquatic beings prevails, a pact for the end of gravity.
In the background, Bermuda Triangle echoes in a hypnotic and melancholic tone. Like crashed airplanes, we find ourselves drawn into this dream where manta rays conspire with the stars and the moon rises through the seaweed. Useless fugitives from the violence of the lights – "I wish those lights could make this pain go away / I wish those lights could make them come back again" – more than just a pretext for the background, we found an alternative to the mere terrestrial existence.
The music video from Lázaro Matos's latest album, Waves and Whirlpools, works as a binding element. Repeatedly circular, manta rays, bubbles, lights, faces, seaweed, and jellyfish are taken slowly, dancing on the screen and attracting immersion. Without knowing for sure whether a whirlpool or black hole, the audiovisual experience invites you to an astral journey through a lysergic ocean of extraterrestrial beings and sea monsters. The Bermuda triangle is a founding myth, a symbolic clot, a wormhole between the mysteries of the universe and the ocean, the geographical position that speaks of the landscapes' power to make things disappear.
Lights of unknown origin, strange latitudinal movements, and unidentified circular elements form an alliance with the hoops of light suspended around the gallery. Like a promiscuous bridge between unknown worlds, the Ring Lights, which could be stars that survived the refraction of water, air bubbles, or UFOs, suggest a hybrid luminescence that gives a neon status to the sea, as if all that peaceful and silent landscape had been taken by an electric shock. The LED light, more than illuminating a face for any Tik Tok video, is here as a mysterious ring that quickly transforms into an unidentified object, scanning the vast star horizon of the cosmos.
The mural, a recurring element in the artist's practice, occupies the entire gallery and seems to impose specific conditions of temperature and pressure. Under this surface, large canvases are like spaces that create other spaces, threatening the stability of walls that seem to follow secret sea currents. On one hand, the electrifying lightness of the elements transports us toward a naive elation, nourished by this dreamlike universe that is not known if it came out of a cartoon, Instagram filter, or dream. On the other hand, the density of the seabed is very tangible in these self-portraits that appear in the waves, showing the profile of the artist who paints while diving. Mixing humour and drama, the seriousness underlying the desire to imagine other relational modes and heterogeneous communities between humans and non-humans is disturbed.
Along with the movement of the waters, we are seduced by the languid undulation of the manta rays that surround us, emotional figures that guide the experience to levitation. The series of ceramic pieces entitled Everything Is Going To Be Alright create a collective suspended body that functions as a lost link between the cosmos and the ocean, a moving, spatial being, slowly wandering through the void. Close to the ground, they are a living extension of the ground, guided by the undecipherable march of Bermuda Triangle – “Above the water, soaking life in mystery.” As beings of doubtful origin, they guide us on this astral journey through the oceanic soils. They perform a slow movement as if prescribed for a diagnosis of anxiety. They are an invitation to lay down and become a bed. Like a magic carpet or a spaceship with an uncertain course, they launch themselves into an underwater cruising, flirting with the depth and the surface.
It is said that we know less about the seabed than we know about the universe, an unknown that we call depth. Luís Lázaro Matos reminds us of the limitedness of dry surfaces when faced with aquatic ones, of terrestrial surfaces faced with interstellar ones. He also reminds us of the importance of distrust and the ability to be surprised. As Maurice Blanchot once said, it is necessary to recognize this power: “showing us that things are perhaps not what they are, that it falls to us to see them otherwise and, by this opening, render them first imaginarily other, then really and entirely other."
Lior Zisman Zalis
PT
O mergulho nesta atmosfera subaquática pede ao corpo uma coreografia específica: a confusão entre o nado e o voo. Em Seabed Monsters and the Cosmic Rays, a terceira exposição individual de Luís Lázaro Matos na Madragoa, é preciso suspeitar da gravidade e orientar-se por flutuações. Uma instalação multimédia que surge como ecossistema híbrido de luzes e espuma, areias e planetas, naves e criaturas marinhas, confundindo o profundo dos oceanos com o vazio do cosmos. Neste exercício imaginativo, Luís Lázaro Matos inventa um mundo no qual prevalece uma empatia entre os astros e os seres aquáticos, um pacto pelo fim da gravidade.
De fundo, Bermuda Triangle ecoa em tom hipnótico e melancólico. Quais aviões acidentados, vemo-nos arrastados para este sonho onde mantas estabelecem conluio com as estrelas e a Lua nasce por entre algas marinhas. Inúteis fugitivos da violência das luzes - "I wish those lights could make this pain go away/ I wish those lights could make them come back again" - mais que pretexto para o fundo, encontramos uma alternativa à mera existência terrestre.
O vídeo da música do último álbum de Lázaro Matos, Waves and Whirlpools, funciona como elemento aglutinador. De forma repetitivamente circular, mantas, bolhas, luzes, rostos, algas e águas vivas são levadas lentamente, dançando na tela e atraindo à imersão. Sem saber ao certo se redemoinho ou buraco negro, a experiência audiovisual convida a uma viagem astral por um oceano lisérgico de seres extraterrestres e monstros marinhos. O triângulo das Bermudas é um mito fundador, um coágulo simbólico, um wormhole entre os mistérios do universo e do oceano, a posição geográfica que fala da capacidade das paisagens de fazer desaparecer.
Luzes de procedência desconhecida, movimentos latitudinais estranhos, e elementos circulares não identificados formam uma aliança com os aros de luz suspensos pela galeria. Como uma ponte promíscua entre mundos desconhecidos, os Ring Lights, que poderiam ser estrelas que sobreviveram à refração da água, bolhas de ar ou OVNIs, sugerem uma luminescência híbrida que dá um estatuto neon ao mar, como se toda aquela paisagem tranquila e silenciosa tivesse sido tomada por um choque elétrico. A luz led, mais que iluminar um rosto para qualquer vídeo de Tik Tok, é aqui aro misterioso que rapidamente se transforma em objeto não identificado, perscrutando o vasto horizonte estrelar do cosmos.
O mural, elemento recorrente na prática do artista, ocupa toda a extensão da galeria e parece impor condições específicas de temperatura e pressão. Sob esta superfície, telas de grande porte são como espaços que criam outros espaços, levando as paredes a desorientar- se na sua estabilidade e seguirem secretas correntes marinhas. Por um lado, a eletrizante leveza dos traços transporta-nos para outros montantes da ingenuidade, criando este universo onírico que não se sabe se saído de um desenho animado, filtro de Instagram ou sonho. Por outro, a densidade do fundo do mar sente-se bem nesses autorretratos que transparecem nas ondas, contornos do artista que pinta mergulhando. Cruzando humor e drama, inquieta-se a seriedade que subjaz o desejo de imaginar outros modos relacionais e comunidades heterogêneas entre humanos e não humanos.
Acompanhando o movimento das águas, seduz-nos o ondular lânguido das mantas que nos cercam, figuras emocionais que orientam a experiência à levitação. As peças Everything Is Going To Be Alright, esculpidas em cerâmica, criam um corpo coletivo suspenso que funciona como um elo perdido entre o cosmos e o oceano, um ser movente, espacial, vagueando lentamente pelo vazio. Rente ao chão, são uma extensão viva do solo, orientadas pela marcha indecifrável de Bermuda Triangle - “Above the water, soaking life in mystery”. Como seres de procedência duvidosa, guiam-nos nesta viagem astral pelos solos oceânicos. Realizam um movimento demorado como se houvessem sido prescritas para um diagnóstico de ansiedade. São convites a serem leito. Como um tapete mágico ou uma nave espacial com rumo incerto, lançam-se num cruising subaquático, flertando com a profundeza e a superfície.
Dizem que conhecemos menos do fundo do mar do que conhecemos do universo, uma incógnita pelo que chamamos de profundeza. Luís Lázaro Matos lembra-nos da pequenez das superfícies secas perante as aquáticas, das terrestres perante as interestelares. Lembra- nos também da importância de desconfiar e da capacidade de estranhar. Como certa vez disse Maurice Blanchot, há que reconhecer esta potência: “mostrar que as coisas talvez não sejam como são, que depende de nós vê-las de outra forma e, justamente através dessa abertura, torná-las imaginariamente outras e logo realmente outras."
Lior Zisman Zalis
Artworks