MADRAGOA
A Cadência de uma Chama
Gonçalo Preto
17 January – 9 March 2024 Galeria Madragoa Lisbon, Portugal
Press release

EN

 

"Painting is a deceiving medium," says Gonçalo Preto, reflecting on a versatile practice he has committed to for nearly a decade. In this latest body of work, A Cadência de uma Chama (his third solo exhibition with the gallery), Preto presents a haunting series of oil paintings depicting the sceneries contained within our minds and other dreamscapes. In a sequence of uncanny compositions painted in gradient layers of blue glazes and gray monochromes, the artist freely distributes clues about their stories through fragmented narratives and glimpses of ordinary representations: a dentition, the reflection of a window, a watery windshield at night, or a synapse. Between reality and artifice, this series opens up new emotional and visual realms, akin to the principles of magic realism, at once familiar and elusive.

 

The choice of painting in the “blue spectrum” comes from Preto’s association of blue with interior spaces within the body, particularly within his own mind. Blue can be soothing and calm, and while it is also associated with melancholy and grief, it provides a comforting place to linger, unlike the shorter attention span associated with more feral colors such as yellows or reds.

 

At the gallery entrance, an arresting large canvas titled Córtex (2023) features a realistic depiction of a dental radiograph (X-ray), flanked by a human-shaped silhouette on its left side, as if closely observing the dentition along with the viewer. Particularly attuned to the nuances of light, Preto found inspiration in the nature of X-rays, which penetrate the flesh to unveil the internal workings of our bodies through light. Regarding the theme, while the artist acknowledges a longstanding fascination with the medical and surgical realms, the painting also nods to the peculiar fact of him breaking his front tooth multiple times—a cyclic event he describes as non-traumatic yet undeniably unusual. Between replication and transformation, the painting enters interstitial realms—merging the internal and the external, mixing what is happening within bodies as well as within minds, and amid fluctuating perceptions (through multiple observers, which includes the one in the painting and us).

 

Further ahead, on the left wall, three glass-powder-covered paintings titled Os Três Ws reference three Ws: "Where," "When," and “Who,” although Preto intentionally leaves the viewers to interpret these concepts in their way and assign the Ws accordingly. These pieces, made from drawings, allude to the remarkable capability of our minds to construct mental refuges, akin to traversing and opening up multiple physical spaces. It refers to the creation of entire mind-worlds, whose contents depend on where our attention flows. This phenomenon is particularly poignant in situations of physical confinement, such as during periods of hospitalization. These works also consider how our perception of time varies when confronted with our own mortality, perhaps even more when nearing the end. A possibility revealed by the presence of the double-shadowed skeleton facing us in the central painting, Os Três Ws (Outrora) (2023).

Preto intentionally cultivates a sense of stillness throughout the series, yet the pieces are not silent. Similar to a flame that embodies both stillness and movement in its regular breath, these works possess their own rhythm and vibrations. Physically, this is accentuated by the application of glass powder on their surfaces, providing a velvety finish that Preto describes as a "vessel of light." As viewers approach the triptych, they have a moment of hesitation and pause, unsure whether they should move closer. By reflecting light from the painting itself, rather than representing it, these works transform into tangible and lively objects, requiring viewers to move around and appreciate their physicality, capturing their haloed reflections on their surfaces.

 

Also in the exhibition is, Partitura-Estrelas e Estilhaços (2023), which depicts water dispersed on a dark surface. The patterns thus formed are evocative of celestial bodies, which in turn, through the particular distribution and sizes of the water droplets, evoke musical notes, inspiring the title of the piece. And Cabeçalho (2023), the first painting made in this series and the more abstract. The work combines the rendered texture of an X-ray with an overexposed 35mm film, heralding the search for simplicity, light, and stillness that the artist has engaged since.

 

This exhibition marks a more personal and vulnerable departure for Preto, whose painting process serves as a means to access certain memories and ideas. While meditative, the series is also a reflection of the continual negotiation between what the artist believes the work requires and what the work demands of him. In his approach into stillness and simplicity, Preto engaged in an active editing process, subtracting elements from the paintings until they are no more than what they need to be: minimal and universal, puzzling yet inviting–as a genuine invitation to slow down.

 

 

Cristina Sanchez-Kozyreva

 


 

PT

 

"A pintura é um meio enganador", diz Gonçalo Preto, refletindo sobre uma prática versátil a que se dedicou durante quase uma década. Neste último grupo de trabalhos, A Cadência de uma Chama (a sua terceira exposição individual na galeria), Preto apresenta uma série de pinturas a óleo que retratam os cenários contidos nas nossas mentes e outras paisagens oníricas. Numa sequência de composições inusitadas pintadas em camadas gradientes de esmaltes azuis e monocromos cinzentos, o artista distribui livremente pistas sobre as suas histórias através de narrativas fragmentadas e vislumbres de representações comuns: uma dentição, o reflexo de uma janela, um para-brisas aquoso à noite ou uma sinapse. Entre a realidade e o artifício, esta série abre novos domínios emocionais e visuais, semelhantes aos princípios do realismo mágico, ao mesmo tempo familiares e esquivos.

 

A escolha de pintar no "espetro azul" vem da associação que Preto faz do azul com os espaços interiores do corpo, particularmente dentro da sua própria mente. O azul pode ser calmante e relaxante e, embora também esteja associado à melancolia e ao luto, proporciona um lugar reconfortante para se demorar, ao contrário do tempo de atenção mais curto associado a cores mais ferozes como os amarelos ou os vermelhos.

 

Na entrada da galeria, uma tela de grandes dimensões, intitulada Córtex (2023), apresenta uma representação realista de uma radiografia dentária, acompanhada por uma silhueta humana do lado esquerdo, como se observasse atentamente a dentição juntamente com o espetador. Particularmente atento às nuances da luz, Preto inspirou-se na natureza dos raios X, que penetram na carne para revelar o funcionamento interno do nosso corpo através da luz. Em relação ao tema, embora o artista reconheça um fascínio de longa data pelos domínios médico e cirúrgico, a pintura também acena com o facto peculiar de ter partido o dente da frente várias vezes - um acontecimento cíclico que descreve como não traumático, mas inegavelmente invulgar. Entre a replicação e a transformação, a pintura entra em reinos intersticiais - combinando o interno e o externo, misturando o que está a acontecer nos corpos e nas mentes, e entre percepções flutuantes (através de múltiplos observadores, o que inclui o da pintura e nós).

 

Mais à frente, na parede esquerda, três pinturas cobertas de pó de vidro intituladas Os Três Ws (2023) fazem referência a três Ws: "Onde", "Quando" e "Quem" (1), embora Preto deixe intencionalmente ao espetador a possibilidade de interpretar estes conceitos à sua maneira e atribuir os Ws em conformidade. Estas peças, feitas a partir de desenhos, aludem à notável capacidade das nossas mentes para construir refúgios mentais, semelhantes a atravessar e abrir múltiplos espaços físicos. Refere-se à criação de mundos mentais inteiros, cujos conteúdos dependem de onde a nossa atenção flui. Este fenómeno é particularmente pungente em situações de confinamento físico, como durante períodos de hospitalização. Estas obras consideram também como a nossa percepção do tempo varia quando confrontados com a nossa própria mortalidade, talvez ainda mais quando nos aproximamos do fim. Uma possibilidade revelada pela presença do esqueleto duplamente ensombrado que nos confronta na pintura central, Os Três Ws (Outrora) (2023).

 

Preto cultiva intencionalmente uma sensação de quietude em toda a série, mas as peças não são silenciosas. Semelhante a uma chama que representa tanto a quietude quanto o movimento na sua respiração regular, estas obras possuem o seu próprio ritmo e vibrações. Fisicamente, isto é acentuado pela aplicação de pó de vidro nas suas superfícies, proporcionando um acabamento aveludado que Preto descreve como um "recipiente de luz". Quando os espetadores se aproximam do tríptico, têm um momento de hesitação e pausa, sem saber se se deve aproximar. Ao refletir a luz da própria pintura, em vez de a representar, estas obras transformam-se em objetos tangíveis e vivos, exigindo que os espetadores se movimentem e apreciem a sua fisicalidade, captando os seus reflexos aureolados nas suas superfícies.

 

Também na exposição está Partitura-Estrelas e Estilhaços (2023), que representa água dispersa numa superfície escura. Os padrões assim formados evocam corpos celestes, que por sua vez, através da particular distribuição e dimensão das gotas de água, evocam notas musicais, inspirando o título da obra. E Cabeçalho (2023), a primeira pintura desta série e a mais abstrata. A obra combina a textura renderizada de uma radiografia com uma película de 35mm sobre-exposta, anunciando a procura de simplicidade, luz e quietude que o artista tem vindo a desenvolver desde então.

 

Esta exposição marca uma saída mais pessoal e vulnerável para Preto, cujo processo de pintura serve como um meio de aceder a certas memórias e ideias. Embora meditativa, a série é também um reflexo da negociação contínua entre o que o artista acredita que a obra necessita e o que a obra exige dele. Na sua abordagem à quietude e à simplicidade, Preto envolveu-se num processo de edição ativo, subtraindo elementos das pinturas até estas não serem mais do que aquilo que precisam de ser: mínimas e universais, intrigantes, mas convidativas - como um convite genuíno ao abrandamento.

 

 

Cristina Sanchez-Kozyreva

(tradução de Eládio Cardoso)

 

 

 

(1) Em inglês, “Where”, “When” e “Who”

 

 

Artworks

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