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Imagine this, just for a moment, a young girl walks slowly and with each lonesome stride approaches a small desert mountain. It is 2045, and the world’s cities have fallen into decay, with most residents evacuated for self-sustaining yet fragile countryside existences. As the girl climbs the small sandy mountain, she happens upon a stone object, inlaid with symbols and very much intact. This, to her, is a huge artefact and she runs to gather relatives to analyse it. None of the onlookers can determine exactly its provenance or age, yet it is widely agreed upon that this object comes from ancient and very lost civilisations from eons before. The analysis and conversations continue, and generate within themselves a flurry of emotion, interest, and desire. There is conflict over who should own this object and this competition results in the group consensus that it should stay as a guardian totem within the village commons. Fast forward, many more years, it remains within that sub cultural community and its origins remain unknown. Over the years, legends are written about it, that the object, when touched, can work miracles; that it is a portal to other spheres within the known universe; that it has healing properties; that it was sent particularly to protect this kinship circle from harm. If we now travel backwards in time to 2024, to this space, within this gallery, there are many other artworks close in identity to the one described. They have been crafted and developed in their materiality and content by Alice Guittard. Today’s artwork is tomorrow’s artefact. This is clear. And Guittard builds within her objects an enticing and time enduring symbolism which enables them to travel forward, and backward through the waves of civilisations and to find their place, as consistently enigmatic.
In the opening scene to Chris Marker’s “Sans Soleil”, a work that is part documentary, part visual essay, part novelesque filmic odyssey, we see the image of three children on a road in the countryside of Iceland. The subtitle reads: “He said that for him it was the image of happiness, and that he had tried several times to link it to other images, but it never worked.”. This is a beautiful way of opening a film, and an ever more a metaphor for those events, images, or scenarios that elicit happiness or contentedness, but remain apart from other things, hermetically sealed within their loveliness. This quality of joyful individualism also applies to objects, and Guittard’s work takes on this specificity. “Sans Soleil” continues to narrate scenes from Cape Verde, Japan, Guinea Bissau, Iceland, Paris and San Francisco. It traces the unfolding days of a mysterious protagonist as he crosses the world in search of a hard to define belonging. This parallels the artistic and life practice of Guittard, which entails many synchronicity oriented journeys. Her work and process includes a strong relationship to space, place, and memory. Thus, the artworks that she produces have within them the inheritance of various distinct sites of being.
As a woman, working in the medium of stone, it is important to make clear that the feminist angle that her practice subsumes if of great relevance. The history of stone masonry has been reserved for men, and has been occultified (the Masonic temple), guarded, and remained exclusive. Thus, the medium of stone liasoned with the patriarchy. Guittard refuses to be relegated to the role of the outsider when it comes to using stone for her artworks. She pursues the knowledge of its subtleties and nature despite its association with men, their monuments, and their causes. This practice has within it the seeds and flowerings of micro-political revolution. As Audre Lorde, famously titled an essay within her anthology “Sister Outsider”, “The Master’s tools will never destroy the master’s house”. In contrition, using the master’s tools can redesign the house, can reshape it, can repurpose it. Guittard takes these tools and using them to construct objects of care and magic. Ultimately, when viewed collectively her work as a whole, in situ, provides a context for a very personal investigation of meaning.
- Josseline Black
PT
Imagine isto, só por um momento: uma jovem rapariga caminha lentamente e, a cada passo solitário, aproxima-se de uma pequena montanha deserta. Estamos em 2045 e as cidades do mundo entraram em decadência, tendo a maioria dos habitantes sido evacuados para uma existência rural autossustentável, ainda que frágil. À medida que a rapariga sobe a pequena montanha arenosa, depara-se com um objeto de pedra, incrustado de símbolos e bastante intacto. Para ela, trata-se de um enorme artefacto e corre a reunir os familiares para o analisar. Nenhum dos observadores consegue determinar com exatidão a sua proveniência ou idade, mas é consensual que este objeto provém de civilizações antigas e muito perdidas, de eras passadas. As análises e as conversas prosseguem e geram em si mesmas um turbilhão de emoções, interesses e desejos. Há um conflito sobre quem deve ser o dono deste objeto e esta competição resulta no consenso do grupo de que ele deve permanecer como um totem guardião dentro dos bens comuns da aldeia. Passados muitos anos, o objeto continua a pertencer a essa comunidade sub-cultural e as suas origens permanecem desconhecidas. Ao longo dos anos, foram escritas lendas sobre o objeto, que ao ser tocado, pode fazer milagres; que é um portal para outras esferas do universo conhecido; que tem propriedades curativas; que foi enviado especialmente para proteger este círculo de parentesco de qualquer mal. Se viajarmos agora para trás no tempo, para 2024, para este espaço, dentro desta galeria, existem muitas outras obras de arte com uma identidade próxima da descrita. Estas foram criadas e desenvolvidas na sua materialidade e conteúdo por Alice Guittard. A obra de arte de hoje é o artefacto de amanhã. Isto é claro. E Guittard constrói nos seus objetos um simbolismo sedutor e duradouro que lhes permite viajar para a frente e para trás através das ondas das civilizações e encontrar o seu lugar, consistentemente enigmático.
Na cena de abertura de "Sans Soleil", de Chris Marker, uma obra que é parte documentário, parte ensaio visual, parte odisseia cinematográfica novelesca, vemos a imagem de três crianças numa estrada no interior da Islândia. No subtítulo lê-se: "Disse que, para ele, era a imagem da felicidade e que tinha tentado várias vezes ligá-la a outras imagens, mas que nunca tinha funcionado". Esta é uma bela forma de abrir um filme e uma metáfora cada vez mais forte para esses acontecimentos, imagens ou cenários que provocam felicidade ou contentamento, mas que permanecem à parte de outras coisas, hermeticamente fechados na sua beleza. Esta qualidade de individualismo alegre também se aplica aos objetos, e a obra de Guittard assume esta especificidade. "Sans Soleil" continua a narrar cenas de Cabo Verde, Japão, Guiné-Bissau, Islândia, Paris e São Francisco. Traça o desenrolar dos dias de um misterioso protagonista que atravessa o mundo em busca de uma pertença difícil de definir. Isto é paralelo à prática artística e de vida de Guittard, que implica muitas viagens orientadas para a sincronicidade. O seu trabalho e processo incluem uma forte relação com o espaço, o lugar e a memória. Assim, as obras de arte que produz têm dentro de si a herança de vários sítios distintos do ser.
Enquanto mulher, a trabalhar no médio da pedra, é importante deixar claro que o ângulo feminista que a sua prática subsume é de grande relevância. A história da alvenaria de pedra tem sido reservada aos homens e tem sido ocultada (o templo maçónico), guardada e mantida exclusiva. Assim, o médio da pedra associou-se ao patriarcado. Guittard recusa-se a ser relegada para o papel de forasteira quando se trata de utilizar a pedra nas suas obras de arte. Ela persegue o conhecimento das suas subtilezas e da sua natureza, apesar da sua associação aos homens, aos seus monumentos e às suas causas. Esta prática contém em si as sementes e as flores de uma revolução micro-política. Como Audre Lorde intitulou um ensaio da sua antologia "Sister Outsider", "The Master's tools with never dismantle the master's house". Em contrição, a utilização das ferramentas do mestre pode redesenhar a casa, pode remodelá-la, pode dar-lhe uma nova finalidade. Guittard pega nessas ferramentas e usa-as para construir objetos de cuidado e magia. Em última análise, quando visto coletivamente, o seu trabalho como um todo, in situ, fornece um contexto para uma investigação muito pessoal do significado.
- Josseline Black
Artworks